quinta-feira, 13 de maio de 2010

COLUNA DA JUSSEMARA



SOCIEDADE OU DOMÍNIO DA ALIENAÇÃO?


Estridentes e inúmeros discursos não faltam neste país julgando a precariedade das relações sociais, a exploração no trabalho, as mazelas humanas – indignamente abandonadas na espera do amanhã indiferente do hoje. Ações? Raras e excessivamente divulgadas. Ajudar o outro – uma atitude indescritivelmente bela e tão comum em tempos passados tornou-se, atualmente, um programa de marketing e, por conseguinte, meio de proporcionar admiração e louvores eternos àquela criatura “tão solidária”.
No Brasil, segundo a Organização Mundial da Infância, três a cada cinco crianças trabalham. “É mais um descaso pela vida inocente de crianças usadas como combustível na produção do mercado mundial.” (BOFF, Leonardo). O velho e ignóbil capitalismo moldou e ainda aliena diversas pessoas, conduzindo-as ao consumismo desenfreado, marquista e preconceituoso. Aos poucos, o cuidado com a dimensão espiritual, mental e familiar vão sendo abandonados, inclusive, com certa expressão de pudor. O materialismo bradou mais alto e é o que há de mais sólido na cabeça de milhões de pessoas. 
Frente aos desmazelos e às tentativas de alguns, em melhorar o estado deplorável da sociedade, tanto condenam abertamente, ignorando a importância destas ações que salvam, permitem melhor qualidade de vida e oferecem oportunidades a quem não tem condições sequer de ter esperanças. Somadas, as bolsas e auxílios dos programas governamentais, dirigidas à população carente, mesmo sem a devida fiscalização, compõem apenas 1% do PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro. Enquanto isso, 43% do PIB escorre, com pouquíssimas críticas, ao sistema financeiro internacional (detalhe: o sistema financeiro, como capital especulativo, não produz e não gera nada, apenas troca moedas e lucra, inflando os bolsos daqueles que simultaneamente exploram e riem com muito sarcasmo dos que trabalham arduamente.)
É fácil criticar as pessoas que sofrem com os desmoronamentos, por morarem em locais impróprios, em morros cujo solo é extremamente instável, na periferia... No entanto, por que as favelas não ocorrem nos centro das cidades, onde o solo é mais seguro? Ah! Não é qualquer indivíduo ter prata suficiente pra adquirir 1m² no bairro do centro e então armar sua barraca em cima. Refugia-se, então, onde ninguém mais habitaria devido à ameaça de risco iminente. Inevitavelmente, um contingente humano se aglomera na busca de um espaço para se proteger dentro de suas lonas, no entanto, não há qualquer indivíduo de pompa neste lugar, visto que temem morrer num deslizamento e rechaçam a convivência tão próxima...

É freqüente o menosprezo ao assistencialismo dos governos, principalmente quando não se necessita desse amparo. Mais severa ainda, é a sentenciação dos militantes dos movimentos sociais, alcunhados de baderneiros. Pra ter essa repugnante opinião, que denigre os movimentos sociais, basta consentir com a mídia conservadora e não questioná-la, apenas transmitir as informações tal como foram divulgadas.
Mas por que ocupar terras alheias? Comenta-se apenas o fato e não as condições que culminaram no mesmo acontecimento. A quem pertencem estas terras? Alguma coisa está sendo produzida nelas? Se for cultivada, quais produtos e qual o destino dos mesmos?Há respeito em relação à natureza? Quem está na terra é o proprietário legal? O mesmo proprietário cumpre as obrigações que lhes são pertinentes?
Grande parcela das terras ocupadas integra o conjunto de terras devolutas, pertencentes à união, ocupadas em usucapião por alguém que se considera dono, ou ainda, compõem a série de latifúndios brasileiros que mantém a terra desprovida de plantação, no aguardo de um preço compensatório no mercado externo. Sim, mercado externo, pois quando plantam, sob exagerada mecanização, uso de OGM (Organismos Geneticamente Modificados) e agrotóxicos, é para exportar, trazendo lucros exclusivamente ao latifundiário. Não há geração de empregos: usam-se máquinas, destroem a natureza, mediante o uso indiscriminado dos agrotóxicos, e induzem ao desequilíbrio ecológico com os transgênicos. E, apesar disso tudo, os latifundiários têm uma defesa enorme e exaltada por parte dos brasileiros. Enquanto isso, o MST foi o grande contribuinte para o aumento da produtividade brasileira, não somente pela sua produção, e sim por forçar o uso da terra.
Quem planta para abastecer a mesa dos brasileiros é o pequeno agricultor, o sem terra, o camponês... que segundo dados do último senso agropecuário, produz cerca de 70% dos alimentos que chegam as nossas mesas, no entanto, continuam sendo impiedosamente criticados, mesmo vendendo deus produtos por valor irrisório.
Modificar opiniões já consolidadas é um processo trabalhoso e exige também espírito crítico, que procede do constante embate de idéias, fatos e análise criteriosa das ideologias existentes na sociedade. Portanto, antes de tomar qualquer posição, seja ela radical, de direita, de esquerda, ou como alguns preferem, para não se comprometer, “em cima do muro”, é imprescindível pensar nas estratégias e objetivos que estão ocultos nos mais diversos acontecimentos, programas, sejam eles noticiários ou não, livros, e-mails e demais meios de comunicação; e ainda cabe a pergunta: você sabe quanto custam trinta segundos no horário nobre de televisão? Saiba que você, em frente à TV, contribui para elevar essas cifras.

JUSSEMARA SOUZA DA SILVA
Outono de 2010.
RDC WEB BRASIL
 PORTO ALEGRE

COLUNA DA JUSSEMARA


À ESPERA DE ATITUDE – “A GENTE SE VÊ POR AQUI”



É estarrecedora a capacidade que alguns meios de comunicação têm em ridicularizar o sofrimento alheio. Apesar da tristeza de milhares de pessoas, que tiveram seus parentes e amigos mortos pelo desmoronamento da lama e lixo, além de suas casas destruídas, ainda há o desprezo quanto a essa tragédia.
Uma jornalista, do alto de seu posto e indignação, expõe o desafio em chegar até as áreas de risco, e o fez em honra à sublime e admirável missão de veicular as informações aos telespectadores. Relatou o estado crítico da estrada de acesso, a qual comprometeu seu carro por esse cair em um “buraco”( nas palavras da própria), e parar de funcionar, sendo, inclusive, tapado de lama por outro veículo que por ali passou. Conclui, acabados os detalhes, que essa foi a tragédia para ela, ou seja, para seu nada egoísta ser.

Uma atriz criticou os representantes políticos, por não adotarem medidas que evitassem todo o caos. Acusou-os de incitar a população a morar nestes locais impróprios. Também intencionou culpar os fumantes, ao afirmar que as pontas de cigarro são responsáveis por entupir os canais de escoamento de água. Outra atriz, da mesma emissora, expôs sua dramática incomunicabilidade, devido ao corte na emissão de energia elétrica, fato que inviabilizou seu celular sem bateria, deixando-a impaciente.
A diretora de uma novela conseguiu fazer, da gravação de um capítulo, a mais patética epopéia. Descreveu a árdua chegada ao estúdio, em meio à forte chuva e com o alarmante auxílio da polícia – cuja ajuda deveria estar voltada aos desabrigados e não a uma diretora que se dirige ao trabalho -. Tudo isso, claro, para que as cenas fossem ao ar no tempo estipulado. A heróica diretora finalizou dizendo que, em razão do sufoco e correria pelos quais passou, também sofreu a tragédia de Niterói...
O apresentador do programa, com os olhos quase fora de órbita , para realçar o poder da fala que se arquitetava, pronuncia-se com colérico fervor ante o número de mortos e desabrigados. Em seguida, questiona as atrizes referidas anteriormente, qual ritmo musical elas preferiam dançar... Seria possível sensibilizar-se com as aquelas pessoas que perderam tudo ou quase tudo e, simultaneamente, pensar em ritmos de dança? Apenas hipocrisia?
Até quando determinados meios de comunicação conseguirão subjugar a tristeza, o sofrimento e a dor de perder a família, os amigos, e tudo que milhares de pessoas construíram? Enquanto esse contingente populacional mergulha na amargura da abominável catástrofe, alguns lunáticos reduzem o mesmo acontecimento aos pequenos e insignificantes dramas pessoais, como “sobreviver” dois dias sem energia elétrica, sem bateria no celular, lutar contra a chuva que ameaça a chegada à gravadora, perceber que o carro parou de funcionar porque caiu na poça, enfim, engrandecendo as passagens, ao extremo de parecer que moravam no morro que desabou.
 As pessoas são incentivadas a morar nestes locais? Não, elas são obrigadas, não há outro lugar onde suas condições econômicas permitam habitar. E ainda precisam tolerar as constantes acusações de ignorância e teimosia, por permanecerem em habitações condenadas pelo risco iminente. No entanto, não há um terreno seguro que possam comprar, então vão continuar morando neste morro ou em qualquer outra periferia. Aliás, é presumível que, no arriscado morro, não se encontre qualquer alguém com boas condições econômicas.
O detestável hábito de livrar-se da responsabilidade, empurrando-a para os governantes, assinala, novamente, o descaso de tantos brasileiros com seus conterrâneos, esperando que as atitudes e soluções venham de cima. Como havia um lixão enterrado, por cúmulo, justamente no morro? Lixo que foi produzido por toda a cidade – e não apenas pelos fumantes – a qual quis livrar-se dos próprios resíduos em um local distante do belo centro, apesar de haver moradores no mesmo endereço destinado ao lixão.
Na são as atitudes de um governante que modificarão a situação das famílias que residem em áreas inóspitas. Imprescindível, é que a toda a sociedade tenha consciência e responsabilidade, não obstante, enquanto o interesse capitalista se sobrepor à dignidade de vida e à preocupação com o outro, não haverá mudança. A falta será sempre do governante, que produziu sozinho todo o lixo da cidade, que enviou as pessoas para povoarem o morro de solo instável... E alguns veículos de comunicação e alienação farão, também, somente o seu lamento ridículo, esperando uma atitude e declamando ao final: “A gente se vê por aqui!”.

JUSSEMARA SOUZA DA SILVA
RDC WEB BRASIL
PORTO ALEGRE